Como você reagiria se tivesse que ficar frente a frente com pessoas acusadas de pertencer a uma violenta facção criminosa e ainda decidir se eles são culpados ou inocentes de um assassinato? Para o Ministério Público de São Paulo, em um julgamento esta semana, os jurados ficaram com medo e tomaram uma decisão equivocada.
Na quinta-feira passada (4), pela primeira vez vão a júri popular três acusados de um assassinato ocorrido na série de ataques que aterrorizaram São Paulo em 2006. Conclusão dos jurados: os réus são inocentes.
“Eles decidiram pela absolvição em razão do medo que sentiram de decidir. O império do crime venceu a batalha”, afirmou o promotor de Justiça Marcelo Milani.
Para entender melhor essa afirmação, é preciso voltar no tempo. Numa sexta-feira, 12 de maio de 2006, começam os atentados contra a polícia de São Paulo. Nas cadeias, bandidos se rebelam. Pelo telefone, os parentes sabem de tudo.
Gravações inéditas daquela época, obtidas pelo Fantástico, confirmam: a ordem dos ataques saiu dos presídios paulistas. Criminosos dizem que viraram o sistema. Ou seja, começaram uma mega rebelião.
Filha: Vai virar o sistema todo por causa do Marcola.
Pai: É isso mesmo.
Marcola é Marcos Camacho, o chefe da quadrilha. O motivo dos ataques, segundo a policia, foi o isolamento dos integrantes da facção criminosa em presídios de segurança máxima.
“Morreram 46 policiais e agentes penitenciários. É uma guerra civil que foi instalada naqueles três dias”, lembra o promotor de Justiça Marcelo Milani.
Em uma gravação também inédita, a conversa impressiona. É uma criança que pede ao pai preso que pare com a violência.
Filha: Pai, não faz nada, não.
Pai: ‘Tá’ bom.
Os ataques continuaram. Entre os mortos, está o soldado do corpo de bombeiros João Alberto da Costa, de 41 anos. O assassinato foi criticado até entre os bandidos.
Mulher: Creio que não tinha necessidade dessa ‘fita’ com o bombeiro.
Homem: É do bombeiro, eu achei sacanagem, porque ele salva vida.
Eduardo Vasconcelos, Alex Cavalheiro e Giuliana Custódio eram os acusados de matar o bombeiro que foram julgados esta semana. De acordo com a promotoria, eles estavam no carro usado no crime. Ainda segundo o Ministério Publico, o grupo foi preso logo depois e confessou o assassinato.
Naquela noite, durante o ataque, outro bombeiro também foi atingido pelos disparos. Uma bala acertou o joelho do soldado. No julgamento, esse bombeiro que sobreviveu foi a principal testemunha de acusação. Diante do júri, o PM reconheceu dois réus e afirmou que foram eles que participaram do atentado. Com medo, a família do soldado morto não apareceu no julgamento.
O júri era formado por cinco homens e duas mulheres. Eram quatro estudantes, uma funcionária pública, um engenheiro e um cozinheiro. Seis deles nunca tinham participado de um julgamento. Os réus foram absolvidos por 4 votos a 3 e soltos em seguida.
Os advogados de defesa dizem que não havia provas contra os clientes. Já o promotor do caso, que participou de mais de mil júris populares, é categórico: “Isso foi uma decisão arbitrária, proveniente de medo”, diz o promotor de Justiça Marcelo Milani.
Nos Estados Unidos, quando há suspeita de que alguém corre perigo, os jurados podem ser trocados e o local do julgamento também. Na Colômbia, dez juízes foram assassinados no fim dos anos 1980. Nessa época, foi criada a figura dos juízes sem rosto. Eles nunca tinham contato com os criminosos.
Já na Itália, desde que um juiz foi morto, em 1992, não é realizado mais nenhum júri popular em casos envolvendo mafiosos e terroristas. Esses casos são conduzidos apenas por juízes. No Brasil, a lei determina que juízes e jurados fiquem na mesma sala com os réus.
“A sociedade foi chamada a decidir e colocou os bandidos na rua. Medo de que possam sofrer consequências com a sua decisão”, defende o promotor Marcelo Milani.
O Ministério Público pediu a anulação do julgamento que absolveu os acusados de matar o bombeiro João Alberto da Costa. Há outros quatro suspeitos de participar desse crime que ainda não foram julgados. Um deles é Marcos Camacho, o Marcola, que está preso no interior do estado. Por enquanto, ainda não se sabe quando ele vai ficar frente a frente com as sete pessoas que vão ter a missão de dizer se ele é culpado ou inocente.
“O jurado deve sentir-se seguro, no sentido de que eles possam fazer o seu julgamento de uma maneira absolutamente tranquila, sem que nada vá lhe acontecer posteriormente”, defende o advogado criminalista e professor de Direito Penal, Pedro Lazarini.
fonte:fantastico.globo.com
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